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Publicado em O Estado de S. Paulo, 31/12/2002.

O Brasil dos novos empregos

Amanhã se inicia um governo que ganhou as eleições afirmando que o Brasil precisa criar cerca de 10 milhões de empregos e que tudo fará para que se atinja essa meta em quatro anos. O que esperar?

Penso não ser irrealista enxergar o Brasil como uma grande usina de empregos ao longo dos próximos anos. Nosso país está ainda em construção. No campo da infra-estrutura, por exemplo, temos apenas 160 mil quilometros de estradas pavimentadas, enquanto a Austrália e a Itália têm 300 mil, o minúsculo Japão tem 790 mil e os Estados Unidos, mais de 5 milhões. No turismo, empregamos pouco mais de 3% da força de trabalho, enquanto a média mundial é 10% e a dos países de grande atração é de 20% (França, Espanha, Caribe, etc.). Nossas carências habitacionais são de 6 milhões de unidades (ou 12 milhões quando se consideram residências adequadas). Em matéria de energia, o Brasil precisa construir uma Usina de Tucuruí por ano para poder sustentar o crescimento necessário.

Quando se põe tudo isso em andamento, a quantidade de postos de trabalho criada é fantástica. Esses setores têm um alto potencial de geração de trabalho direto, indireto e remoto. Uma estrada pavimentada, por exemplo, requer trabalhadores não só na atividade direta da sua construção mas, sobretudo, nas atividades indiretas de manutenção e operação, sem falar na enormidade de postos de trabalho remotos que surgem no comércio e serviços ao longo da rodovia. O mesmo ocorre com os investimentos em habitação, energia, turismo, etc.

Para que as oportunidades de trabalho surjam e sejam bem aproveitadas, três fatores serão essenciais: investimentos bem orientados, educação de boa qualidade e legislação trabalhista atualizada.

No primeiro caso, a equipe que assume o governo amanhã já deu todos os sinais de reconhecimento da necessidade de administrar as contas públicas com o máximo de austeridade. Isso é essencial para viabilizar os investimentos governamentais na infra-estrutura e nas áreas sociais, assim como para incentivar os investimentos privados. O novo governo, com realismo, se dispõe a fazer tudo o que for necessário nesse campo.

No caso da educação, há a mesma disposição. Os novos governantes reconhecem ter chegado a hora de ir além da quantidade. A vida moderna, em especial, as novas formas de trabalhar exigem lógica de raciocínio, bom senso, agilidade de pensamento, maleabilidade, transferabilidade, competência técnica, produtividade e muitas outras condutas que só vêm com uma educação de boa qualidade. Os próximos anos terão de ser concentrados na elevação do preparo dos professores e das escolas para compensar a fragilidade da educação da maioria dos pais dos alunos.

No caso das leis trabalhistas, o Presidente Luis Inácio Lula da Silva repetiu inúmeras vezes que nada será feito sem prévia discussão no Fórum Nacional do Trabalho mas com a necessária urgência para colocar o Brasil em condições de igualdade na competição internacional. Temos de sair de uma situação de salários baixos e encargos altos para uma situação de salários altos e encargos baixos. Temos de abandonar o clima do trabalho conflitivo para entrar no mundo do trabalho cooperativo e harmônico. Temos de transferir uma grande parte dos 60% dos trabalhadores informais para uma nova formalidade, baseada em um sistema criativo que seja capaz de atrair os desprotegidos e a eles oferecer um mínimo de proteção, permitindo, em contrapartida o reforço dos recursos da Previdência Social.

Das três grandes tarefas, a retomada dos investimentos e a elevação da qualidade da educação são as mais demoradas. A última é a mais rápida. Pode ser realizada em um ano. Tudo vai depender da boa vontade das partes no Fórum Nacional do Trabalho.

O Brasil ganhará muito se os integrantes do Partido dos Trabalhadores na área do trabalho realizarem os avanços de concepção que foram realizados pelos colegas que assumiram a área econômica.

Uma postura realista e sincera das três partes será a maior contribuição para a transformação daquele Fórum em um laboratório de projetos de leis que, uma vez acertados entre os agentes envolvidos, poderão ser aprovados pelos parlamentares com relativa facilidade. Com isso, o Brasil estará se encaminhando de forma resoluta para ser a maior usina de empregos da América Latina. O sonho de Lula e de todos os brasileiros estará assim concretizado.