Publicado na Revista Exame de 06/08/2003.
Terra Arrasada
O Brasil bateu mais um recorde de desemprego, alcançando a taxa de 13% em junho de 2003.
Apesar da gravidade, o que mais me preocupa é o desemprego de 2004 e 2005. Vejo com muita apreensão os acontecimentos das últimas semanas, em especial, o brutal desrespeito ao di-reito de propriedade (rural e urbana) e aos contratos assinados.
As invasões de fazendas, a ocupação do terreno da Volkswagen, a troca do indexador nos contratos de telefonia, a tomada de um posto de pedágio sob regime de concessão e, sobretudo, a leniência das autoridades perante todas essas agressões, jogaram por terra, em quinze dias, a confiança que o governo tentou construir entre os investidores nacionais e estrangeiros no primeiro semestre deste ano.
Nunca precisamos tanto dos investimen-tos privados. Todos sabem que o país não tem condições para sustentar um crescimento de 4% ou 5% ao ano com a atual fragilidade dos setores de energia, transporte, portos e outros.
Segundo as estimativas da ABDIB, o Brasil terá de investir cerca de US$ 100 bilhões em infra-estrutura ao longo dos próximos 10 anos. Isso é condição básica para o crescimento e para o emprego.
A participação do capital privado será estratégica, pois as finanças públicas continuarão abaladas por muito tempo, mesmo depois das reformas estruturais.
Mas como convencer um investidor na-cional ou estrangeiro para construir uma usina ou uma fábrica que leva três anos para ficar pronta e 5 para come-çar a dar lucro se ele não sabe o que vai acontecer com sua propriedade ao longo desse caminho?
Nas palavras do Presidente da própria ABDIB, vejo o seguinte raciocínio: "A dificuldade, atualmente, é elevar a participação do capital privado nos investimentos em infra-estrutura. Os empresários não querem que o governo entre com mais dinheiro público, mas precisam que ele reconquiste a credi-bilidade para atrair investidores (José Augusto Marques, "A hora da infra-estrutura" Portal da ABDIB, 28/05/03).
No primeiro semestre de 2003, a entra-da de investimentos produtivos estran-geiros desabou. Foram 65% menor do que no mesmo período em 2002, enquanto que na China, um país comunista, que res-peita a propriedade privada (!), foram 48% maior.
Se isso ocorreu até junho, quando o desrespeito ainda não havia atingido o pico da desordem registrada em julho, o que acontecerá daqui para frente?
Quanto tempo levaremos para recon-quistar a confiança perdida? É bom lembrar que a moratória de 1987 nos deixou com a pecha de caloteiros por dez anos! E naquele tempo não tínhamos invasão e ocupação de propriedades e nem um juiz como o senhor Doorgal Andrada, Presidente de uma Associação de Magistrados (MG), que, para defender seus interesses, disse tex-tualmente: "Vamos fechar todos os fóruns e impedir a entrada de advogados e funcionários. Queremos que o movimento tenha repercussão inter-nacional, para afugentar os investi-mentos" (O Estado de S. Paulo, 23/07/03).
Não há dúvidas. Aproximamo-nos do estado de "anomia", onde as pessoas ficam sem saber o que fazer. Isso é arrasador para o investimento, cres-cimento econômico e geração de empre-gos. Se os investimentos produtivos se retraírem agora, quando 13% dos bra-sileiros estão desocupados e 60% no mercado informal, o quadro do trabalho futuro será catastrófico.
O Brasil precisa provar ao mundo que suas instituições são respeitadas e o governo tem de lidar firmemente com os movimentos que ajudou a criar. Para tanto, não será preciso inventar nada. Basta usar a lei, sem rodeios, agindo mais e falando menos.
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