Artigos 

Publicado no Jornal da Tarde, 10/11/2004.

Onde estão os novos empregos?

Você, caro leitor, deve ter ouvido à exaustão os anúncios do governo segundo os quais o Brasil teria criado mais de 1,4 milhão de empregos formais ao longo de 2004. Ao mesmo tempo, como cidadão, deve estar intrigado com esses números uma vez que na sua roda de amigos e parentes raros são os que conseguem se empregar. O que está acontecendo?

Paulo Mol, economista da Confederação Nacional da Indústria, também se intrigou com isso e partiu para uma comparação de pesquisas. Tomando os devidos cuidados para evitar aberrações metodológicas, Mol selecionou nos dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) realizada pelo IBGE junto aos domicílios de seis regiões metropolitanas apenas os empregados formais (com registro em carteira), para compará-los com os empregados constantes do Cadastro Geral de Emprego e Desemprego (CAGED) que é utilizado pelo Ministério do Trabalho para "provar" a criação de mais de 1,4 de novos empregos formais nas mesmas regiões metropolitanas.

O economista encontrou uma diferença brutal entre as duas pesquisas. Os dados utilizados pelo Ministério do Trabalho registram 1,4 milhões de empregos a mais do que os dados do IBGE ("Pesquisas oficiais têm desencontro de 1,4 milhão de vagas", Estado, 13/10/2004).

Na pesquisa utilizada pelo Ministério do Trabalho, as empresas registram mensalmente quantos empregados foram admitidos e quantos foram demitidos. Daí surgiu o saldo positivo de 1,4 milhões de empregos formais no citado período.

Será que todos esses empregos são vagas novas que foram preenchidas por pessoas que estavam desempregadas (ou que nunca trabalharam) ou são vagas que já estavam preenchidas por pessoas que trabalhavam na informalidade?

Sinto dizer que a grande maioria cai no segundo caso e é fruto da intensificação da fiscalização junto às micro, pequenas e médias empresas, onde a informalidade impera. O próprio Ministério do Trabalho informa que, de janeiro de 2003 a setembro de 2004, cerca de 1,1 milhão de trabalhadores foram registrados nas ações de fiscalização (Secretaria de Inspeção do Trabalho, 27/10/2004).

A fiscalização deve ser exercida com todo rigor, pois afinal, as leis têm de ser respeitadas. A regularização decorrente da ação dos fiscais gera, de fato, um grande número de "novas admissões". Mas não se trata de novos empregos e sim de velhos empregos que existiam em condições irregulares.

É claro que uma parte dos empregos é resultante da recuperação da economia nos setores ligados às exportações, agro-negócio e administração pública, inclusive, campanhas eleitorais. Mas a maior parte foi "gerada" pela ação dos fiscais no exercício de suas responsabilidades legais.

Ocorre que, quando a fiscalização aperta as micro, pequenas e médias empresas, estas registram os empregados informais, ficam com eles por 3 ou 4 meses, despedindo-os em seguida, pois não agüentam as despesas de 103,46% sobre o salário. Como não se trata de vagas novas e como o tempo de contratação regular é curto, os "novos empregos" não aparecem nos domicílios pesquisados pelo IBGE e nem na família do caro leitor.

É bom lembrar que, só em 2004, os brasileiros investiram US$ 8,825 bilhões no exterior e o Brasil recebeu apenas US$ 3,555 bilhões de investimentos produtivos de fora para dentro, descontados os movimentos de troca de ativos da AmBev, estimados em U$ 6 bilhões ("Brasileiros aceleram investimento no exterior", Estado, 03/11/2004). No ano 2000, o Brasil recebeu mais de US$ 30 bilhões de investimentos diretos do exterior e não mandou quase nada para fora, sendo que a China, de janeiro a setembro de 2004, já recebeu quase US$ 50 bilhões de investimentos diretos.

Para gerar novos empregos, o primeiro passo, é inverter essa perversa equação. O Brasil precisa investir, no mínimo, 25% do PIB. O segundo passo é simplificar a burocracia e reduzir as despesas para as micro, pequenas e médias empresas que respondem por quase 50% do emprego. O primeiro passo depende do governo mostrar sua firme intenção em respeitar o direito de propriedade e estimular a produção. O segundo depende dos congressistas fazerem de uma vez por todas a tão necessária reforma trabalhista.