Publicado em O Estado de S. Paulo. 28/05/1996
Emprego por prazo determinado
A filosofia que orientou o trabalho temporário ou com prazo determinado nos outros países foi muito simples. A lei e o contrato coletivo precisavam acomodar os interesses dos empregadores que necessitavam desse tipo de trabalho com os dos empregados que, na ausência de outra alternativa, estavam dispostos a trabalhar nessas condições.
Isso contemplou as empresas que têm trabalho sazonal; as que têm encomendas com prazo certo de entrega; as que se dispõem a completar a formação de jovens; as que desejam reempregar trabalhadores de meia-idade e várias outras.
A lei brasileira sempre impediu esse tipo de contratação, com exceção de casos muitos especiais e pouco usados (trabalho por empreita, obra certa, etc.). No Brasil, a legislação é extremamente rígida. Para empregar um trabalhador, a empresa tem de pagar um "pedágio" de 102% sobre o seu salário na forma de encargos sociais – ou pagar 0%, se contratar ilegalmente. Não é à toa que 57% dos trabalhadores estão no mercado informal.
O projeto elaborado pelo Ministério do Trabalho criou um ponto intermediário entre 0% e 102% de forma a permitir ao contratante uma economia de cerca de 22% dos encargos sociais atuais.
Mas, para fazer jus a isso, a empresa seria obrigada a cumprir um longo ritual. Pela proposta original, ela teria de negociar esse assunto com os sindicatos e com eles estabelecer um acordo ou convenção coletiva onde seria fixado o número de empregados a ser contratado. Esse não poderia ultrapassar 20 % do quadro atual.
Para tanto, a empresa teria de exibir a sua folha salarial do mês anterior e provar que os contratados eram, de fato, adicionais e não substitutos. Depois de tudo, o contrato teria de ser registrado no sindicato de trabalhadores. O benefício da redução dos encargos só valeria enquanto persistissem as condições iniciais – o que teria de ser provado periodicamente so sindicato. À reboque, o projeto restringia as horas extras a 120 por ano.
A evidente complexidade dessa sistemática mais inibe do que estimula o emprego. O ritual proposto, por natureza, se ajusta mais ao acordo do que à convenção coletiva, pois os requisitos apontados só podem ser estabelecidos em nível de empresa.
Alfaiates, barbeiros e costureiras enfrentarão a mencionada burocracia
Ocorre que as micros e pequenas empresas – que têm o maior potencial para ampliar o emprego formal – raramente negociam e firmam acordos com os sindicatos. Refiro-me à pequena alfaiataria que está disposta a empregar mais um oficial; à barbearia que deseja contratar um engraxate por ocasião das festas natalinas; à costureira que precisa de uma ajudante por quatro meses, e outros.
A parafernália proposta é utópica. Será que o alfaiate, o barbeiro e a costureira iriam se dispor a enfrentar a mencionada burocracia para se beneficiarem de uma redução de 22% de encargos sociais? Ou continuariam empregando, ilegalmente, no mercado informal?
As complicações mencionadas foram evitadas nos outros países. Por exemplo, na Argentina, a Lei 24.467/95 dispensou as micros, pequenas e médias empresas dos rituais da negociação, acordo e convenção. Essa é também a orientação do substitutivo apresentado pelo deputado Mendonça Filho. Ele simplificou a referida sistemática; deu estímulos para as empresas menores; remeteu a questão das horas extras para a negociação; e atrelou a contratação a uma simples comunicação do Ministério do Trabalho.
O assunto será discutido e votado por estes dias. A tentação de se voltar à burocratização original é tão grande quanto perigosa. O substitutivo não é perfeito, mas tem muito mais chance de gerar alguns empregos adicionais quando comparado com a peça original.
A lei, se aprovada, também terá prazo determinado. Valerá por um ano, tempo em que as partes e o governo terão para avaliar o que realmente estimula o emprego. O mercado, mais uma vez, dará ao Congresso Nacional a oportunidade para simplificar ainda mais a matéria. E há muito o que simplificar.
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