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Trabalho apresentado no Congresso da Indústria, FIESP, São Paulo, 25/05/2006

Desemprego e Informalidade no Brasil

O Brasil tem três problemas graves na área trabalhista. Em primeiro lugar, destaca-se o desemprego de 10,5% que atinge cerca de 8 milhões de pessoas. Em segundo lugar, desponta a informalidade de 60% que envolve cerca de 48 milhões de brasileiros que trabalham sem proteções. Em terceiro lugar, está o alto nível de desavenças trabalhistas que se traduz em cerca de 2 milhões de processos que tramitam na Justiça do Trabalho. Ou seja, o Brasil é um país de poucos empregos, trabalho precário e conflito elevado.

Problemas dessa magnitude não podem ser resolvidos com propaganda política ou com passes de mágica. A geração de empregos e boas condições de trabalho dependem de três fatores básicos - crescimento econômico, educação de qualidade e legislação adequada.

O Brasil está mal nas três áreas. Nos últimos 20 anos, o país cresceu cerca de 2,5% anuais, que constitui uma média muito baixa para as necessidades de absorver cerca de 1,8 milhão de pessoas que entram anualmente no mercado de trabalho e para reduzir o grande estoque de desempregados e trabalhadores informais. No que tange à qualidade da educação, o país possui uma força de trabalho que, em média, tem apenas 6 anos de escola e má escola – o que é insuficiente para atender os desafios das mudanças meteóricas que ocorrem nas tecnologias e modos de produzir da sociedade do conhecimento. No campo da legislação, o Brasil do século 21 carrega a duras penas uma legislação formulada no início do século 20 e que se mostra cada vez mais disfuncional para proteger as novas formas de trabalhar assim como para estimular a geração de empregos formais nas pequenas e microempresas, do mundo urbano e rural.

A chegada a um nível de crescimento sustentado tem sido dificultada por um cipoal de problemas macroeconômicos que levou o país a praticar taxas de juros escorchantes e uma política tributária destrutiva para os que pretendem investir no lado real da economia.

O atingimento de um nível de educação de boa qualidade tem sido adiado pela conjunção da falta de boas escolas e bons professores com as deficiências sócio-culturais que atingem os numerosos grupos de baixa renda de norte a sul do país.

E, finalmente, a protelação da modernização das instituições do trabalho (legislação trabalhista, organização sindical e Justiça do Trabalho) tem sido causada pela falta de liderança dos governos e do medo dos parlamentares em perder votos na aprovação de medidas por eles julgadas como impopulares e interpretadas pela população como uma estratégia de retirar direitos conquistados ao longo de décadas.

Enquanto essas três providências não ocorrem, o Brasil continua com um baixo nível de investimentos produtivos e reduzida capacidade de gerar emprego e trabalho de boa qualidade. A alta informalidade, em si, agrava esse quadro, pois a evasão contributiva gera enormes déficits na Previdência Social (em 2005, foi quase R$ 40 bilhões) o que força o governo a recorrer ao mercado financeiro ou usar recursos do superávit fiscal. As das medidas desestimulam os investimentos e a geração de empregos. A primeira, porque força a subida da taxa de juros e a queda de investimentos privados. A segunda porque consome recursos púbicos que deveriam ser investidos nas áreas sociais que, como se sabe, além de urgentes, geram muito emprego.

A informalidade atinge em cheio as pequenas e microempresas que não têm condições de superar a burocracia de leis trabalhistas e previdenciárias detalhadíssimas e as despesas de contratação geradas por essas mesmas leis. Para empregar um funcionário legalmente, uma empresa tem de arcar com uma despesa de contratação de 103,46% como mostra a tabela abaixo.

Despesas de Contratação de Empregados Industriais Horistas

Tipos de Despesas

% sobre o Salário

Grupo A –Obrigações Sociais

 

Previdência Social

20,00

FGTS

8,50

Salário Educação

2,50

Acidentes do Trabalho (média)

2,00

SESI/SESC/SEST

1,50

SENAI/SENAC/SENAT

1,00

SEBRAE

0,60

INCRA

0,20

Subtotal A

36,30

Grupo B –Tempo não Trabalhado I

Repouso Semanal

18,91

Férias

9,45

Abono de Férias

3,64

Feriados

4,36

Aviso Prévio

1,32

Auxílio Enfermidade

0,55

Subtotal B

38,23

Grupo C –Tempo não Trabalhado II

13º Salário

10,91

Despesa de Rescisão Contratual

3,21

Subtotal C

14,12

Grupo D –Incidências Cumulativas

 

Incidência Cumulativa Grupo A/Grupo B

13,88

Incidência do FGTS s/13º sal.

0,93

Subtotal D

14,81

TOTAL GERAL

103,46

Fonte: Itens da Constituição Federal e da CLT.

Nenhuma dessas despesas pode ser negociada. Todas são compulsórias por força de leis ordinárias e Constituição Federal. Para a grande maioria das empresas, que são pequenas e microunidades, tais despesas são impraticáveis – o que as leva a contratar na informalidade ou simplesmente não contratar.

Em 1988, o Brasil cometeu o grave erro de "constitucionalizar" uma grande parte dos direitos até então garantidos por leis ordinárias. Agora é muito difícil encontrar parlamentares dispostos em "desconstitucionalizar" esses direitos, temendo, com isso, perder popularidade e base eleitoral.

Uma maneira mais amena de se conseguir uma mudança seria a de manter todos os direitos assegurados pela Constituição Federal (no artigo 7º. que trata dos direitos sociais) abrindo-se, porém, a possibilidade de negociação para quem o desejasse.

Mesmo assim essa mudança é difícil. Ela gera insegurança na população que não quer sair de uma situação de direitos garantidos a poucas pessoas (os incluídos) para uma situação de direitos negociados para muitas pessoas (os excluídos). O lobby dos incluídos é muito mais forte do que o descontentamento dos excluídos.

Por essa razão, o Brasil terá de se contentar, por ora, com reformas infra-constitucionais. Nesse campo, há que se considerar dois universos que, pela sua diversidade, exigem mudanças específicas.

Para os empregados, o Autor deste ensaio tem proposto a criação de um "Simples Trabalhista" que reduziria a burocracia e as despesas de contratação para as pequenas e microempresas – a exemplo do que fez, com sucesso, o Programa Simples aprovado em 1996.

Para os trabalhadores por conta própria, o Autor tem sugerido a criação de um sistema previdenciário diferenciado com alíquotas baixas e benefícios parciais para, com isso, estimular a vinculação daqueles trabalhadores à Previdência Social, garantido-lhes proteção e assegurando receita aos cofres do INSS.

Para os dois grupos, o Autor propõe a aprovação e implantação do Cartão Único de Identificação, reunindo informações trabalhistas, previdenciárias, da Receita Federal, do Registro Geral e da Justiça Eleitoral. Esse cartão seria o documento básico para o recebimento de benefícios e o exercício da cidadania.

Medidas como essa são parciais e graduais, mas têm a vantagem de serem politicamente viáveis e abrirem a porta para uma caminhada mais ambiciosa. Elas trariam para o mundo da proteção previdenciária, de forma lenta, cerca de 48 milhões de brasileiros que estão na informalidade, contribuindo assim para reduzir o déficit da Previdência Social e a taxa de juros e, conseqüentemente, a geração de empregos e de trabalho de melhor qualidade. Enquanto isso, a educação deveria avançar para assegurar maior qualidade à força de trabalho e produtividade mais alta à economia como um todo.