Publicado em O Jornal da Tarde,03/12/1997
Medo de empregar
Ao mesmo tempo em que o Brasil se debatia em 1997 com uma terrível falta de emprego e as empresas propunham aos trabalhadores reduzir jornada e ganhar menos, nos Estados Unidos os empresários lutavam para conseguir funcionários e não conseguem.
é isso mesmo. Quem indicasse um candidato a vendedor para as grandes lojas daquele país, ganharia US$ 100. Se o indicado passasse nos testes, quem indicou ganharia mais US$ 150. Nada mal, não é?
Isso estava acontecendo também no setor de serviços e na indústria. A falta de trabalhadores passou a ser um problema sério naquele país. A taxa de desemprego atingiu o mais baixo nível dos últimos 25 anos (4,7%) e, em certos estados, ela não chegava a 2% (Wisconsin, Illinois, Indiana, Minnesotta e outros).
A Boeing teve um prejuízo de US$ 600 milhões em 1996 devido à falta de técnicos que pudessem apressar a montagem e entrega dos aviões encomendados.
As grandes redes de hotéis e restaurantes estavam contratando profissionais multilíngues na Polônia, Hungria e República Checa. Os shopping-centers estavam oferecendo um prêmio em dinheiro para que os funcionários em tempo parcial passassem a trabalhar em tempo integral. O salário-hora do pessoal em tempo parcial, em geral na base de US$ 5.15 por hora, aumentou para US$ 6.00 e US$ 7.00 (havendo casos de US$ 8.50).
Bem diferente era o caso da Europa onde o desemprego só aumenta. Na Alemanha, os desocupados ultrapassaram os 12% da força de trabalho e o seguro desemprego estava custando ao país cerca de US$ 120 bilhões por ano, o que reduzia a capacidade de investimento e de gerar empregos do país. Na França, o desemprego bateu a casa dos 13%; na Itália, 15%; na Bélgica 16%; e na Espanha, mais de 20%.
Os grandes mandatários da Europa reuniram-se em Luxemburgo, no final de 1997, para tentar resolver a questão. Resultado: um retumbante fiasco. Eles decidiram apenas treinar mais os trabalhadores e rejeitar a redução da jornada de trabalho feita por lei, admitindo-a, porém, por negociação a nível das empresas - como começa a ocorrer agora no Brasil.
Na Europa, só a Inglaterra e a Holanda tinham baixo desemprego: 5,5%. Isso foi fruto das mudanças nas leis trabalhistas realizadas na década de 80. Naquele época, os dois países flexibilizaram a contratação, a descontratação e a remuneração da mão-de-obra. Nesse sentido, eles se aproximaram dos Estados Unidos. Resultado: mais emprego!
Por isso, convém olhar com carinho as negociações em São Paulo que examinam novas maneiras de flexibilizar o trabalho. é bem provável que a redução de jornada e salário não venha a criar novos postos de trabalho, de imediato. Mas, certamente, ela evitará a destruição dos atuais e dará sobrevida às empresas que, mais tarde, criarão novos empregos - direta e indiretamente. é isso que está em jogo. Vê-se claramente como, na hora da crise, a flexibilidade se torna extraordinariamente importante.
é verdade que, entre nós, o grande problema é a contração do consumo e dos investimentos vivida nos anos 90. Mas, além disso, o Brasil insistiu em manter uma legislação trabalhista rígida que tem apenas uma maneira de contratar mão-de-obra, ou seja, por prazo indeterminado e pagando 102% de encargos sociais.
A única maneira legal de contratar trabalho com mais flexibilidade era a desenhada pelo projeto de lei que trata da contratação por prazo determinado que foi aprovado apenas em janeiro de 1998 - depois de 18 meses de "chocadeira" no Congresso Nacional.
Nas condições vividas pela maioria dos desempregados, esse tipo de conduta chegou às raias do impatriotismo, gerando, entre os empresários, o medo de contratar e, entre os trabalhadores, a tragédia de não poder trabalhar.
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