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Publicado em O Estado de S. Paulo, 12/06/2007.

Falta mão-de-obra

O Brasil é um país intrigante. Ao mesmo tempo em que o desemprego atinge 10% dos brasileiros, setores específicos ressentem-se da falta de profissionais.

Os casos mais eloqüentes são os dos setores petroquímico, sucro-alcoleiro e da construção civil. O Presidente da Petrobrás, José Sergio Gabrielli teme que a falta de profissionais qualificados venha impedir a implantação dos projetos da empresa. Os produtores de cana-de-açúcar e etanol, dizem que apenas um terço dos trabalhadores disponíveis têm condições de operar e fazer pequenos ajustes nas modernas máquinas que estão entrando no setor. Os empresários da construção civil revelam escassez de mão-de-obra qualificada e até mesmo não qualificada.

Esse filme já passou em outros períodos em que a economia brasileira deslanchou. Se o PAC de fato implementar os investimentos previstos – cerca de R$ 500 bilhões - a falta de mão-de-obra será brutal.

Ao fenômeno da falta de mão-de-obra associa-se o fato de que muitas pessoas que recebem benefícios dos programas assistenciais (Bolsa Família e outros) não quererem trabalhar. Isso acontece até mesmo entre os não qualificados. Por que um trabalhador vai sair do nordeste, deixando sua família para trás, para ganhar R$ 500 como servente de pedreiro na construção civil de São Paulo se lá, juntando os recursos da Bolsa Família, de uma ou duas aposentadorias (que tiveram um grande aumento nos últimos anos), a renda familiar é superior aos R$ 500?

O mesmo acontece na agricultura. Por que um trabalhador vai entregar sua carteira de trabalho a um empregador que lhe paga R$ 380 no período de safra, que dura de três a quatro meses, se, para tanto, ele tem de desistir do benefício do Bolsa Família que dura 12 meses?

Os que estão próximos de se aposentar também são arredios ao registro em carteira de trabalho. Se isso é feito, eles têm de contribuir mais tempo para a Previdência Social ou se aposentar por idade (65 anos), como pessoa carente. Preferem esperar sem trabalhar e viver dos benefícios do Bolsa Família e de outros programas assistenciais.

A falta de mão-de-obra freia a própria modernização. Cerca de 40% das empresas não compram mais tecnologia devido à inexistência de pessoal qualificado para operar e manter as máquinas. Na Índia esse percentual é de apenas 20% (Luciana Rodrigues e outros, "Apagão de mão-de-obra freia avanço do Brasil", O Globo, 15/05/07). Há alguns anos atrás, perguntei a um ministro hindu sobre os determinantes da disparada do crescimento de seu país, ao que ele me respondeu: São três "es": education, engineering and english.

No setor de serviços a escassez de mão-de-obra qualificada é crônica. Milhares de vagas permanecem em aberto por falta de pessoal adequado. Nesse campo, o inglês costuma ser um entrave sério. Em um país em que 60% dos brasileiros são analfabetos funcionais em português, seria demais querer que eles soubessem inglês...

Pode ser demais, mas é isso que decide o futuro dos jovens e do próprio país. Na China, cerca de 300 milhões de trabalhadores falam ou estudam inglês. Na Índia nem se fala, pois o país teve colonização britânica. Nos países do leste europeu, o estudo do inglês é acelerado e generalizado entre os jovens.

No Brasil, as poucas empresas de "call centers" que trabalham para o exterior encontram uma enorme dificuldade para preencher 100 ou 150 vagas com quem tem fluência em inglês. Por isso, não podem crescer o quanto o mercado permite.

O entrave ao crescimento é o preço que o Brasil está pagando por ter dado tão pouca atenção à educação de boa qualidade e à formação profissional. Ao longo do tempo, os recursos para as Entidades do Sistema S (SENAI, SENAC, SENAT e outros) diminuíram, em lugar de aumentar. Outras escolas profissionalizantes passaram pelo mesmo problema. O Ministério da Educação informa que 747 mil alunos estão matriculados em escolas técnicas de longa duração. Isso não é nada para uma força de trabalho de 90 milhões de pessoas e para um país que precisa crescer na base de 5% e 6% ao ano.

Os estragos da negligencia passada estão mostrando a sua cara. As empresas que se preparem: a pressão por aumento de salários vai aumentar muito. Felizes serão as que encontrarem os profissionais que precisam.