Publicado em O Jornal da Tarde,10/04/1996
A polêmica sobre o desemprego
Terminou na semana passada mais uma reunião do Grupo dos Sete à respeito do problema do desemprego. Essa é a terceira tentativa dos países mais ricos do mundo (França, Alemanha, Inglaterra, Itália, Estados Unidos, Canadá e Japão) para resolver um problema que atinge mais duramente os trabalhadores da Europa.
A discussão realizada em Lille, mais uma vez, terminou sem propostas. Isso reflete, em grande parte, uma grande controvérsia que ainda existe sobre o assunto.
Gary Becker, Prêmio Nobel de Economia de 1992, por exemplo, argumenta que a rigidez da legislação trabalhista e dos contratos coletivos assim como a acumulação de concessões das políticas previdenciárias da Europa são as principais responsáveis pelo alto nível de desemprego naquela região (Why Europe is Drowning in Joblessness). De fato, nos anos 70, a taxa de desemprego esteve abaixo de 5% na França, Alemanha e na maioria dos países europeus. Hoje, ela está perto de 12% na França e Alemanha e ultrapassa os 20% na Espanha.
Economistas europeus como, por exemplo, David Marsden (Deregulation or Cooperation?) argumentam que a desregulamentação do mercado de trabalho nos Estados Unidos são os grandes causadores do rebaixamento dos salários e do aumento da desigualdade naquele país.
Essa é a polêmica: Bons e poucos empregos na Europa versus maus e muitos empregos nos Estados Unidos. Mas, o que dizem os números?
Há 20 anos atrás, a força de trabalho dos Estados Unidos era composta de 110 milhões de trabalhadores e a da Europa, 136 milhões. Nesse período, os Estados Unidos adicionaram 30 milhões de postos de trabalho e a Europa apenas 11 milhões.
é verdade que os salários do pessoal menos qualificado vem crescendo muito lentamente quando comparados com os anos 80. Mas, ao se levar em conta o baixo nível de inflação dos últimos três anos (2,5% ao ano), vê-se que os salários mais baixos cresceram à base de 1% ao ano acima da inflação.
A desigualdade de renda dos Estados Unidos decorre fundamentalmente da elevação acelerada dos salários do pessoal mais educado e dos alto-executivos que, nos últimos três anos, cresceram, em média, 9% ao ano. Cerca de 60% dos empregos criados naquele período foram preenchidos por pessoal técnico e de nível superior que ganham salários substancialmente superiores à média.
Na reunião de Lille, esses números foram avaliados das mais diferentes maneiras. Os americanos, evidentemente, mostraram confiança na desregulamentação e capacitação da mão de obra. Os europeus, por detestarem a idéia de abandonar concessões, pleitearam uma "terceira via" entre a globalização e o estado de bem estar social - via essa que não foi explicitada e para a qual não houve nenhuma proposta concreta.
Um debate desse tipo parece extremamente distante do Brasil. Mas isso não é verdade. O nosso país está cada vez mais afetado nos mercados globalizados. Os salários nominais, sem dúvida, são bem mais baixos do que na Europa ou Estados Unidos. Mas, para o mercado formal, o nível de regulamentação é altíssimo e o nível de capacitação é baixíssimo.
A combinação de muita legislação com pouca educação constitui um cocktail perverso para se enfrentar os problemas que surgem a cada dia no mundo do emprego. Para agravar o quadro, o país mantém uma política cambial que patrocina a geração de empregos no exterior e uma política de juros que aniquila qualquer possibilidade de geração de trabalho internamente.
Somando-se tudo isso conclui-se que o desemprego de 5,7% registrado em Março passado - embora baixo para os padrões europeus - tenderá a subir e o mercado informal - este sim, gigantesco e atingindo 57% da nossa força de trabalho - tenderá a crescer de modo explosivo, causando grandes danos aos cofres da previdência e enorme instabilidade para os trabalhadores atingidos.
Como se vê, o problema do emprego no Brasil é bem mais grave do que o registrado pelos números considerados alarmantes pelos americanos e europeus. A nossa agenda de trabalho demanda esforços para inverter os vários vetores que hoje castigam a força de trabalho. O Brasil precisa voltar a investir, exportar mais, baixar os juros, desregulamentar a legislação trabalhista e melhorar a capacitação da nossa mão de obra. Haja fôlego!
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