Publicado no Jornal da Tarde, 09/07/2003.
Aprendizagem e primeiro emprego
A imprensa deu pouca ênfase ao componente da aprendizagem no Programa "Primeiro Emprego", lançado pelo governo no dia 30 de junho de 2003.
Segundo a lei 10.097/2000, todas as empresas passaram a ser obrigadas a admitir jovens de 14 a 18 anos, colocando-os em programas de aprendizagem para a aquisição de uma profissão. Essa obrigatoriedade envolve a admissão de 5% a 15% do quadro de pessoal que requer qualificação.
Para a indústria, a exigência de 5% existia desde 1942, quando foi criado o SENAI. A nova lei ampliou os percentuais e estendeu a obrigatoriedade para todos os setores - agricultura, comércio, serviços, indústria e atividades financeiras.
O aprendiz terá de trabalhar, no máximo, seis horas por dia, dividindo o tempo entre trabalho e aprendizagem em cursos regulares. Tais cursos e a contratação dos aprendizes são no máximo de 24 meses.
A lei não obriga as empresas a reterem os diplomados. Mas, terminada a aprendizagem ou dispensados os aprendizes, as empresas têm de contratar outros em seus lugares. É um sistema de cota permanente, que se soma às cotas dos portadores de deficiência, cujos percentuais variam de 2% a 5%, de acordo com o tamanho das empresas.
Tomando-se a cota de 5% para base de cálculo dos aprendizes, as empresas brasileiras terão de contratar cerca de 700 mil adolescentes. Trata-se de um número apreciável, tratando-se de uma contratação contínua.
De certa maneira, o Brasil tenta imitar o "sistema dual" da Alemanha no qual o adolescente passa metade do tempo na escola e metade no trabalho. Com isso, aquele país conseguiu construir uma força de trabalho talentosa e altamente qualificada.
A idéia é ótima mas, no Brasil, a sua aplicação terá de ser gradual e cuidadosa. Nem as empresas, nem as boas entidades de qualificação profissional estão aparelhadas para enfrentar esse desafio.
Ademais, isso tem um custo que pode bater nos preços e, com isso, comprometer a competitividade das empresas e os empregos dos jovens. Como se sabe, as despesas de contratação no Brasil são muito altas - cerca de 103% do salário. No caso do aprendiz, são um pouco mais baixas porque há uma redução da alíquota do FGTS de 8,5% para 2%. Mesmo assim, chegam perto dos 97%.
Portanto, esse componente do Programa "Primeiro Emprego", muito valioso para alavancar a qualidade da força do trabalho no Brasil, requer mecanismos realistas na fase de sua implantação.
O gradualismo, a cooperação e a integridade são essenciais. É importante assegurar que os menores sejam matriculados em cursos de boa qualidade. Isso não é fácil de conseguir pois, a aprendizagem é uma tarefa complexa que exige equipamentos atualizados, professores bem preparados e material didático adequado.
Forçar o cumprimento imediato das cotas, levará as empresas a procurarem entidades inescrupulosas, criando, assim, a "indústria da aprendizagem".
O Brasil está repleto de cursinhos de "faz de contas", de faculdades de fins de semana e de escolas que aparentam ensinar e alunos que aparentam aprender - uma enganação cooptada.
A incorporação do componente aprendizagem no aludido programa foi feliz. Mas o controle de qualidade terá de ser rigoroso.
Nesta primeira fase, convirá às autoridades concentrar sua atenção muito mais na estimulação do que na punição das empresas.
Ao estimular, elas poderão aferir a qualidade da aprendizagem e elevar o nível da nossa força de trabalho. Ao punir, elas conseguirão, no máximo, o cumprimento da lei e a proliferação de entidades aventureiras.
O Brasil precisa de um programa realista que melhore a qualificação dos trabalhadores, dentro da capacidade das empresas e das boas agências de formação profissional. A combinação desses tr6es ingrediente é tão importante quanto a inclusão da aprendizagem no Programa "Primeiro Emprego".
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