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Publicado no Jornal da Tarde, 14/11/2001

Médicos administradores

Na medida em que as empresas se transformam e se tornam complexas, as profissões também vão mudando, ora se especializando, ora se mesclando e, muitas, desaparecendo.

A Editora Futura acaba de publicar os resultados de pesquisa que mostra uma demanda crescente (e não atendida) por médicos-administradores em um país onde o número de médicos cresce muito mais depressa do que a população. É o mesmo paradoxo que acontece em outras profissões. De um lado, faltam empregos; de outro, faltam profissionais.

Enquanto a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda um médico para cada 1.000 habitantes, no Brasil essa relação é de um para 469. No Conselho Regional de Medicina de São Paulo, a taxa de médicos registrados aumenta na base de 7,3% ao ano (Edson Yamamoto, Os novos médicos administradores, Futura, São Paulo, 2001).

Com esse excesso de oferta, especialmente nas regiões mais desenvolvidas, a maioria dos médicos tem uma vida difícil. Mais da metade tem três empregos que mensalmente rendem menos de R$ 1.000,00 líquidos cada um. O mais grave é que, para chegar a esse nível, os médicos trabalham 12 horas por dia, alimentam-se mal e ausentam-se de casa por mais de 15 horas. São poucos os que podem dar aos seus pacientes bons exemplos de qualidade de vida.

A maioria dos médicos trabalha em prestadores de serviços (hospitais, laboratórios e centros de saúde), em operadoras de serviços (planos de assistência médica, seguradoras de saúde, cooperativas médicas e empresas de autogestão) e, poucos, em consultórios particulares.

Nos últimos 20 anos, as prestadoras e as operadoras de serviços cresceram não só em número mas, sobretudo, em complexidade. Para ter sucesso, não basta que prestem um bom atendimento médico; é preciso que sejam eficientes, produtivas pois, do contrário, não terão condições de investir em ciência, tecnologia e pessoal especializado.

Com o aumento da concorrência e a pressão dos consumidores, dos PROCONs, da imprensa e dos "advogados de porta de hospital", as organizações médicas estão sendo obrigadas a redobrar a qualidade dos serviços. Para tanto, precisam de bons médicos, para-médicos e administradores.

Na pesquisa realizada - repleta de valiosos dados - ficou claro que médico e médico-administrador são especialidades que guardam entre si uma enorme interface. Não é possível ser bom administrador sem ser bom médico.

As boas organizações no campo da medicina têm uma idéia clara quando buscam recrutar um médico-administrador no mercado de trabalho. É um mito dizer-se que vai administrar quem fracassou na medicina. Ao contrário, o médico-administrador precisa ser um profissional bem sucedido como médico, atualizado em vários campos e, além disso, ter habilidades técnicas para lidar com pessoas, controlar custos, valorizar o cliente como prioridade, manejar as finanças. Ao lado disso tudo, ele não pode abdicar um só minuto da atualização no campo das ciências médicas.

No Brasil, há uma demanda explosiva por esse tipo de profissional. Nós, clientes e pacientes, que ficamos na ponta da linha, muitas vezes não percebemos a importância da boa administração da organização que nos serve.

A carreira de médico-administrador depende muito da vivência de situações concretas, além de capacidade técnica. Para não perder a respeito dos colegas e garantir a qualidade dos serviços, o médico-administrador tem que estudar continuamente administração e medicina. Estamos, assim, diante de mais uma profissão, outrora especializada (médico), e que hoje é uma das mais polivalentes.

Para a melhoria da saúde das pessoas e das organizações, o Brasil precisa acelerar a formação desse tipo de profissional. As recomendações de Edson Yamamoto são oportunas e de grande valor para se avançar nesse campo.