Publicado em O Estado de S. Paulo, 16/11/2004.
Educação e trabalho
Entre 127 países, o Brasil ocupa a triste 72ª. posição em matéria de qualidade de ensino. Essa é a conclusão do relatório da UNESCO publicado na semana passada (Education for All, Global Monitoring Report 2005, Paris: UNESCO, 2004).
Para a UNESCO, a qualidade da educação se baseia em quatro indicadores bastante elementares: a universalização do ensino fundamental, o nível de alfabetização dos adultos, a taxa de permanência até a 5ª. série e a paridade de gêneros nos estabelecimentos escolares.
O Brasil fica na 32ª. posição no primeiro indicador, na 67ª no segundo e na 66ª no que tange à paridade de gêneros. O indicador referente à permanência dos estudantes até a 5ª. série nos coloca na lamentável 87ª. posição.
As causas desse baixo desempenho são conhecidas: turmas superlotadas, professores mal qualificados, escolas mal equipadas e estudantes pouco estimulados.
É verdade que fizemos progressos nos últimos tempos. Entre 1993 e 2003, os brasileiros de dez anos ou mais que tinham, em média, 5 anos de escola, têm hoje 6,4 anos. Mas isso não é motivo para comemorações. Afinal, 6,4 anos de escola não são nada na sociedade do conhecimento.
Para o grupo dos jovens entre 20 e 24 anos, chega-se a 8,5 anos de estudo. Continua sendo muito pouco em um mercado de trabalho que demanda conhecimentos e condutas adequadas às novas tecnologias e modos de produzir.
A proporção dos brasileiros que têm 11 anos ou mais de estudo passou de 14,4% em 1993 para 24,9% em 2003 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Rio de Janeiro: IBGE, 2003). Foi um avanço, sem dúvida. Mas isso é irrisório, pois só um quarto dos brasileiros completam o ensino médio ou chegam ao superior e três quartos ficam aquém dessa marca.
Por sua vez, o recrutamento está cada vez mais rigoroso. Em 2003, nas regiões metropolitanas, 98% das vagas oferecidas foram preenchidas por pessoas que cursaram 11 anos de escola ou mais. Quem estava abaixo disso, amargou um prolongado desemprego ou a precarização do trabalho.
Em suma, o nosso quadro educacional continua um desastre. Isso é ruim para as pessoas e péssimo para o país. Trata-se de um problema que tem raízes profundas. Os países que estão em melhor situação, tomaram providências há muito tempo. No referido relatório, a UNESCO relata que a matrícula de 96% das crianças na escola ocorrida no Brasil em 2002 foi atingida pela Coréia do Sul em 1959! Ou seja, estamos com quase meio século de atraso. A Irlanda atingiu a meta de educação secundária generalizada no início dos anos 60 e, dali para frente, entrou firme na educação superior. As duas nações são as que mais brilham em matéria de progresso nos dias de hoje.
Como no Brasil, todos os países que ampliaram a matrícula passaram em seguida por forte pressão por qualidade. Mas eles logo tomaram providências, melhorando a qualificação dos professores, reduzindo o tamanho das classes e re-equipando as escolas.
É verdade que a educação em algumas nações desenvolvidas também enfrenta problemas. Os testes de matemática, linguagem e ciências revelam desempenhos decrescentes dos alunos americanos, ingleses, alemães e franceses, devido às mesmas causas e com um agravante: nos últimos 30 anos as novas alternativas de trabalho surgidas para as mulheres (que são maioria na categoria docente) foram muito mais atraentes do que as do magistério. Os estudos mostram que isso teve um forte impacto negativo na qualidade do ensino. Mas, além de terem um nível educacional bem mais alto, esses países estão tomando providências enérgicas para remover as causas do baixo desempenho. A principal é a revalorização dos professores, acompanhada de treinamento contínuo.
O problema do desestímulo à carreira docente está presente no Brasil de forma muito mais grave pois, uma grande parte dos nossos professores do ensino fundamental não possui formação universitária e, em muitas regiões, a sua remuneração gira em torno do salário mínimo.
Emprego depende de crescimento econômico, educação de qualidade e legislação trabalhista modernizada. Por isso, não podemos ter ilusões. Será preciso um grande esforço durante várias décadas para o Brasil poder elevar o nível de empregabilidade.
O retorno da boa educação é alto para os cidadãos e mais alto ainda para a sociedade. O emprego e a renda são seus subprodutos imediatos. O bem estar coletivo e a ampliação dos horizontes das gerações futuras são retornos de longa duração e de cálculo inestimável para o progresso de uma nação.
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