Publicado no Jornal da Tarde, 23/01/2001
A cola nas escolas
Os americanos pesquisam de tudo descobriram que a "cola" está se transformando em epidemia nas escolas dos Estados Unidos.
Algumas instituições realizam pesquisas sistemáticas sobre a honestidade (e desonestidade) dos alunos e, para tal, usam métodos sofisticados para obter respostas confiáveis e comparáveis através do tempo. Em 1969, cerca de 34% dos alunos de segundo grau dos Estados Unidos revelaram ter colado, pelo menos, esporadicamente. Em 1989, esse percentual subiu para 67%.
Nos dias atuais, os dados mostram que em 75% dos casos, há algum tipo de comportamento desonesto, incluindo-se aqui os estudantes que entregam como trabalhos escolares textos captados na Internet, sem a menor preocupação com plágio ou cópia (Center for Academic Integrity, Duke University).
Nesse campo, a Internet tornou-se um convite à desonestidade. Hoje em dia, há vários "sites" que preparam trabalhos sob medida mediante pagamento e garantindo absoluto sigilo. O "schoolsucks.com" recebe mais de 10 mil visitas por dia e fornece "trabalhos originais" à base de US$ 4.95 por página.
É a indústria da cola propelida pela tecnologia da informática. Alunos menos aquinhoados ou mais preguiçosos copiam os trabalhos comprados pelos colegas, introduzindo aqui e ali, pequenas mudanças para dar "aquela" originalidade à bela obra prima.
Os professores entraram em pânico e passaram a reagir. Várias medidas foram tomadas para controlar a cola, a cópia e o plágio. Uma delas, é o estabelecimento de códigos de conduta aos quais os alunos devem aderir se quiserem continuar naquelas escolas. Outras usam a própria tecnologia da informática para fazer um contra-ataque aos coladores contumazes. O portal "plagiarism.org" contém milhares de textos fornecidos pelos que se especializaram em vender trabalhos. Através deles, os professores podem detectar cópias, enxertos ou reformas de textos pré-fabricados.
Várias instituições vem se dedicando ao combate à cola e ao restabelecimento de um mínimo de honestidade na conduta dos alunos. Isso é muito importante para qualquer país e para os próprios alunos. Afinal, eles terão de competir num mercado de trabalho que não tem a menor complacência para com os incompetentes. A manutenção da ética nos estudos é tão importante quanto a preservação da ética no trabalho.
No Brasil, não dispomos de pesquisas para quantificar o grau de honestidade (ou desonestidade) nas escolas. Mas, presumo, que está havendo muitos desvios de conduta.
Como professor sempre fui vigilante. Mas não garanto que tenha evitado a cola. Enfrentei casos de muita esperteza. Tive um aluno que, apesar de ser cego, colou num dos exames orais que ministrei. Notei que o rapaz respondia muito bem as perguntas quando punha a mão no bolso do paletó, onde estavam vários cartões cifrados em braile. Questionado, ele confessou que estava colando por não ter tido tempo de memorizar o que a sua irmã preparou nos cartões. Anulei o exame e fiz outro na semana seguinte, com sucesso, e mantendo suas mãos sobre a mesa. Ele era um bom aluno.
Se, há dez anos, consegui apanhar um cego colando, imaginem o que se passa nos dias atuais com o uso da Internet, das fábricas de trabalhos escolares, dos pontos de som escondidos atrás das orelhas e tantas outras facilidades da tecnologia moderna. É um novo mundo e o grande desafio é usar a mesma tecnologia e elaborar os códigos de ética para formar nas escolas bons profissionais e não plagiadores criativos.
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