REVISTA CNT TRANSPORTE ATUAL
Edição Informativa DA CNT Ano XXIII Número 259 Maio 2017
REFORMAS A SOLUÇÃO PARA O BRASIL
Setor de transporte defende a continuidade das reformas
Trabalhista e Previdenciária como melhor resposta à crise e
para a retomada do desenvolvimento nacional
“O Brasil é um país privilegiado, especialmente pelo seu povo, que não tem
preguiça para trabalhar. Não há solução sem trabalho”
Entrevista José Pastore Sociólogo e Professor da USP
O país precisa de um choque de equilíbrio
por Diego Gomes
Entre quem entrar, a situação econômica do país não mudará da noite para o dia. A
necessidade de austeridade será a mesma”. Esse é o alerta do sociólogo e professor da
USP (Universidade de São Paulo) José Pastore ao avaliar possíveis mudanças no
cenário político. Em entrevista à CNT Transporte Atual, ele adverte que, a despeito da
crise política crônica por que passa o país, as reformas são imperativas à retomada do
desenvolvimento econômico e requisito fundamental para o crescimento futuro.
“Chegamos a um nível de tensão social extremo. Na mesma hora em que as incertezas
no campo político exigem cautela e tolerância estas são essenciais para sairmos da
crise”, diz. Ele pontua que a sociedade deve cobrar não apenas uma saída política para o
atual momento, mas também cobrar do Legislativo a votação das reformas estruturantes
de que o Brasil necessita.
Especialista nas áreas de relações do trabalho, emprego, recursos humanos e
desenvolvimento institucional e autor de mais de 35 livros sobre o tema, Pastore
salienta que a Reforma Trabalhista aprovada pela Câmara dos Deputados (e, agora, em
tramitação no Senado) é inteligente por abrir espaço para empregados e empregadores
negociarem diferentemente do que diz a lei, sem revogá-la. Segundo o professor, foram
definidos 15 direitos que podem ser negociados coletivamente e o acertado prevalecerá.
“Mas é um convite voluntário. Se empregados e empregadores não quiserem negociar,
eles continuarão com as proteções da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
“Com menos conflitos e mais empregos, surgirá
um ambiente de negócios mais favorável para
as empresas e para os empregados”
“Pela via da negociação, todas as peculiaridades
são acertadas. Isso é melhor para os
empregados e para os empregadores. É o jogo
do ganha-ganha”
“Aos poucos, os empresários perderão o
atual medo de empregar e começarão a
gerar novos postos de trabalho”
Na conversa, Pastore registrou que o sistema brasileiro de relações do trabalho é do tipo
estatutário e ultrapassado, no qual as regras são praticamente todas fixadas por lei. O
professor comenta que, nas sociedades modernas, predomina o sistema negocial, em que
são garantidos apenas os direitos básicos e as partes fixam as demais proteções por meio
de negociações coletivas e individuais. “Esse sistema é superior para economias
heterogêneas e diversificadas, pois é impossível fixar na legislação todos os detalhes de
proteção que se aplicam às diversas situações do mercado de trabalho”.
O professor atribui à desinformação a resistência que as reformas propostas pelo
governo vêm enfrentando por parte de alguns setores da sociedade. Ele considera ainda
que haverá substancial redução no Custo Brasil com a aprovação desses projetos. Na
sua concepção, aos poucos, os empresários perderão o atual medo de empregar e
começarão a gerar novos postos de trabalho. “Com menos conflitos e mais empregos,
surgirá um ambiente de negócios mais favorável para as empresas e para os
empregados. Isso ajudará a atrair investimentos embora não seja o único fator.” José
Pastore é doutor honoris causa em ciência e PhD em sociologia pela Universidade de
Wisconsin, dos Estados Unidos. Atualmente, é consultor em relações do trabalho e
recursos humanos, e articulista do jornal O Estado de S. Paulo.
Como o senhor avalia a atual conjuntura sociopolítica brasileira?
Respondo estas perguntas um dia após o grave incidente de Brasília quando se
incendiaram ministérios e outras repartições públicas. A situação é preocupante.
Chegamos a um nível de tensão social extremo. Na mesma hora em que as incertezas no
campo político exigem cautela e tolerância, estas são essenciais para sairmos da crise.
Há perspectiva de futuro?
Claro que sim. O Brasil é um país privilegiado, especialmente pelo seu povo, que não
tem preguiça para trabalhar. Não há solução sem trabalho. E essa resposta estará sempre
pronta na população brasileira.
A despeito da crise política, o senhor considera que as votações das reformas
estruturantes devem continuar no Parlamento? Há clima para tal mudança?
Vejo muitos parlamentares bastante comprometidos com as reformas. Hoje em dia,
um consenso amplo a respeito da impossibilidade de se sair da crise sem equilibrar as
contas públicas o que exige, entre outras, a Reforma da Previdência Social. A própria
população está consciente disso apesar da resistência de grupos pontuais que defendem
interesses corporativos.
Em uma eventual abreviação do mandato do atual governo, o senhor teme que
essas reformas não avancem? Nesse caso, qual seria o melhor cenário?
Entre quem entrar, a situação econômica do país não mudará da noite para o dia. A
necessidade de austeridade será a mesma. Por isso, penso que as reformas continuarão a
serem vistas como um requisito fundamental para o crescimento futuro. O país precisa
passar por um choque de equilíbrio para superar os problemas atuais.
Como avalia o conjunto de reformas proposto pelo governo Temer?
Minha área de estudo é o campo do trabalho. A Reforma Trabalhista aprovada pela
Câmara dos Deputados é inteligente porque abre espaço para empregados e
empregadores negociarem diferentemente do que diz a lei, sem revogá-la. Foram
definidos 15 direitos que podem ser negociados coletivamente e o acertado prevalecerá.
Mas esse é um convite voluntário. Se empregados e empregadores não quiserem
negociar, eles continuarão com as proteções da CLT, pois nenhum dos direitos foi
revogado. É o que fez a França no ano passado. A jornada semanal de trabalho é de 35
horas, mas, se as partes quiserem trabalhar 40 horas ou 44 horas, basta negociar e
acertar o valor da hora extra. Entretanto, se não quiserem negociar, valem as 35 horas da
lei atual. O projeto de lei aprovado pela Câmara se espelhou nessa sistemática.
Liberdade com proteção garantida.
Por que forte resistência das centrais sindicais e da sociedade em relação à
Reforma Trabalhista?
A resistência das centrais deve ser explicada pelos dirigentes sindicais laborais. A da
sociedade atribuo à prevalência de uma grande desinformação. O jornal Folha de
S.Paulo realizou uma pesquisa na qual a maioria dos entrevistados se disse contra a
Reforma Trabalhista. Quando se perguntou o porquê, ninguém foi capaz de dizer.
Como o senhor classificaria o sistema de relações do trabalho aqui no Brasil? E
qual sistema seria o ideal?
O sistema brasileiro é do tipo estatutário no qual as regras são praticamente todas
fixadas por lei. É um sistema bastante antigo, proveniente da década de 1940, quando a
única forma de proteção era via intervenção do Estado por meio de leis e da Justiça.
Nas sociedades modernas, predomina o sistema negocial, em que a legislação garante
apenas os direitos básicos e as partes fixam as demais proteções por meio de
negociações coletivas e individuais. Esse sistema é superior para economias
heterogêneas e diversificadas, pois é impossível fixar, nas leis, todos os detalhes de
proteção que se aplicam às diversas situações do mercado de trabalho. O que serve para
os portos não serve para os bancos. O que serve para o transporte não serve para o
comércio. E assim por diante. Mas, pela via da negociação, todas as peculiaridades são
acertadas. Isso é melhor para os empregados e para os empregadores. É o jogo do
ganha-ganha.
A Reforma Trabalhista está, agora, tramitando no Senado, e o projeto de
terceirização foi sancionado pelo presidente Temer. Em quanto tempo o senhor
considera que essas medidas surtirão efeitos práticos no mercado? Por quê?
A reforma aprovada pela Câmara dos Deputados é bastante ampla. Vai demorar algum
tempo para que a sociedade entenda bem todas as mudanças e as coloque em ação. Mas
efeitos de curto prazo. Penso que o Brasil terá uma redução de 50% das ações
individuais que todos os anos entram na Justiça do Trabalho. Isso reduz despesas para
as empresas e para o governo. É redução de Custo Brasil ‘na veia’. Penso ainda que, em
um ou dois anos, as pessoas conseguirão utilizar as novas formas de contratação
propostas pela reforma: teletrabalho, trabalho intermitente, autônomos, terceirização,
tempo parcial, etc. Aos poucos, os empresários perderão o atual medo de empregar e
começarão a gerar novos postos de trabalho. Com menos conflitos e mais empregos,
surgirá um ambiente de negócios mais favorável para as empresas e para os
empregados. Isso ajudará a atrair investimentos, embora não seja o único fator.
O que garante que nenhum direito do trabalhador será revogado?
O artigo 611-A é explícito sobre os direitos negociáveis, sem a revogação do que está na
CLT. E o artigo 611-B deixa claro um rol de 30 direitos sacrossantos que não podem ser
negociados.
Como ficará a Justiça do Trabalho?
A Justiça do Trabalho passará a analisar os casos mais complexos e, sobretudo, os casos
procedentes porque o projeto de lei impõe penalidades e multas para os autores de ações
temerárias ou para partes e testemunhas que mentem perante os juízes. Ademais, os
juízes analisarão apenas os aspectos jurídicos das disputas, deixando de entrar nos
aspectos econômicos. Afinal, eles são treinados para os primeiros, e não para os
segundos aspectos.
Como avalia o fim do imposto sindical? Considera que isso pode enfraquecer a
estrutura sindical brasileira?
Esse é um dilema. De um lado, é preciso acabar com a indústria de sindicatos que
existem apenas para receber o imposto. De outro, que se considerar que muita gente
vai querer viajar de carona, não pagando nada aos sindicatos que realizam negociação e
outros serviços para todas as categorias. Essa contradição terá de ser resolvida na
prática. O desafio para os sindicatos inertes será enorme. Muitos deles desaparecerão.
Outros se fundirão. Alguns procurarão ajuda das entidades superiores (centrais,
federações e confederações). No final, deve surgir uma plêiade de sindicatos mais
representativos tanto do lado laboral quanto do patronal. Os que conseguirem atrair
filiados poderão cobrar a contribuição assistencial ou negocial o que é permitido pela
Justiça do Trabalho. Com isso, poderão recompor suas finanças e fortalecer a prestação
de serviços. Será um mundo mais realista para as entidades sindicais. Quem viver verá.