Publicado em O Estado de S. Paulo. 07/06/1993
O exemplo de Denise Frossard
Ao condenar 14 bicheiros do Rio de Janeiro, a juíza Denise Frossard tornou-se um símbolo nacional. Não é para menos. Num País em que as decisões são tão demoradas e, muitas vezes, inteligentemente evitadas, a conduta daquela juíza surpreendeu e agradou.
Uma pesquisa recente, de âmbito nacional, mostrou que o brasileiro valoriza a lei mas não acredita na Justiça. Cerca de 80% dos entrevistados acham que as leis tem a importante finalidade de garantir o bem estar das pessoas e são essenciais para controlar o que elas fazem. Cerca de 82% concordam que as leis devem ser obedecidas – mesmo quando a gente não gosta delas.
Portanto, o brasileiro acha bom viver dentro da lei. Isso não significa que ele vive e nem que a Justiça seja capaz de manter a lei. Mais de 80% das pessoas acham que a maioria da leis não é cumprida no Brasil e que, de fato, as leis só existem para os pobres. Na opinião da maioria das pessoas, não dá para confiar na Justiça. Quase 90% reclamam contra a lentidão dos processos e 80% acham que os juízes tratam pobres e ricos de modo diferente. Apenas a metade dos entrevistados consideram as sentenças justas e só 34% vêem os advogados como pessoas honestas.
Essa descrença em relação à Justiça se estende a outras instituições de controle social. Cerca de 65% dos entrevistados acham que todos os guardas rodoviários assim como os fiscais que visitam as empresas deixam de multar um infrator quando recebem uma boa caixinha. Na verdade, 93% dos entrevistados pensam que o brasileiro, podendo, sempre tenta corromper a autoridade para se livrar de uma multa.
Aí está a nossa realidade. O brasileiro gosta de viver sob a proteção da lei, mas quando desvia, ele não gosta de ser punido e tenta cooptar a autoridade. Por outro lado, o povo acha que a Justiça é lenta e discriminatória. Nessas condições, é claro que a condenação dos poderosos bicheiros agradou em cheio a opinião pública que sempre julgou ser isso impossível neste País de tanta impunidade.
Atitudes como a da juíza Denise Frossard ajudam a mudar a imagem prevalecente. Magistrados como ela merecem aplausos. O Brasil precisa de muitos exemplos como esse. Mesmo porque, se formos pesquisar mais a fundo, desconfio que o jogo do bicho é uma daquelas infrações que os brasileiros estão dispostos a tolerar. A mesma pesquisa indicou que 51% acham que quando uma pessoa desobedece a lei, mas não prejudica ninguém, não deve ser punida.
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